Hipnose é terapia
Por Victoria Urbani e Alice Germansen
Quem nunca olhou nos filmes aquela cena em que uma pessoa é hipnotizada e começa a fazer tudo o que mandam? Bom, não tem nada a ver com a realidade! A hipnose é uma estratégia terapêutica reconhecida por diversos Conselhos da área da saúde, entre eles o da Medicina, Psicologia, Odontologia e Fisioterapia. A partir dessa abordagem, os profissionais podem tratar condições físicas e psicológicas.
Afinal, o que é entrar em transe hipnótico? A resposta é simples: é entrar em estado de concentração profunda em determinada situação. Por isso, quando nos divertimos com uma comédia ou nos prendemos a um livro, não deixamos de estar hipnotizados.
Em 2020, o youtuber Pyong Lee comandou sessões de hipnose dentro do Big Brother Brasil. A técnica chamou atenção e provocou espanto não só dos participantes do reality show como também do público. Esse método é o que chamamos de hipnose de palco e serve como entretenimento. Já a hipnose para fins terapêuticos, busca o acesso a traumas e memórias. O objetivo é tratar emoções e padrões de comportamento que interferem negativamente na vida do paciente, como dores crônicas, fobias e vícios.
Para entender melhor e esclarecer dúvidas sobre essa prática, conversei com os hipnoterapeutas Marcelo Behm e Margareth Borniatti, que trabalham com hipnose há mais de dez anos. Também ouvi a médica nutróloga Jussara Munareto Silva, que aplica a hipnose no tratamento de reeducação alimentar e emagrecimento.
O que é a hipnose?
Marcelo Behm: primeiramente, precisamos deixar claro que a hipnose não está ligada a nenhum tipo de crença. É apenas o estado alterado da consciência, ou seja, está ligada ao foco e à concentração. Visto isso, você pode ser hipnotizado várias vezes ao longo do dia e nem perceber. Um exemplo é quando assiste a uma série e aquilo lhe desperta alguma emoção. Você sabe que não é real, mas mesmo assim tem uma reação fisiológica. Isso é hipnose.
Jussara Munareto: há a hipnose conversacional, na qual se utiliza metáforas e perguntas que remetem a reflexões. Já na hipnoterapia clínica, o paciente entra em um transe mais profundo. Essa abordagem propicia uma condição mais favorável à mudança de uma forma bem mais rápida. Dentro desse estado de consciência alterado, são utilizadas técnicas de programação neurolinguística e de sugestões hipnóticas.
Margareth Borniatti: Se eu te perguntar o que você fez no seu aniversário de cinco anos, talvez você não lembre. Mas durante a hipnose, há a chance de você me dizer algo sobre esse dia. O poder da hipnose é conseguir olhar para o passado, enxergar tuas ações pouco adequadas e introduzir novos comportamentos.
Como você começou a aplicar a hipnose?
Marcelo Behm: foi quando minha mãe adoeceu de um câncer muito grave. Nem a morfina estava dando mais conta de tanta dor e a hipnose resolveu o problema em minutos. A partir daí comecei a ir atrás de mais conhecimento e informações sobre a hipnoterapia.
Jussara Munareto: a hipnose entrou na minha vida quando eu percebi que o que eu estava fazendo não estava conduzindo um resultado esperado para as minhas pacientes. Faltava algo para melhorar o processo de cura e bem-estar. Sou médica nutróloga e trabalho com emagrecimento. E parte das minhas clientes não conseguiam emagrecer, apesar de todas as informações fornecidas com relação a dietas e atividades físicas necessárias. Algo as impedia e não era por falta de vontade. Ou seja, a parte racional queria mudar, porém uma parte mais poderosa as impedia.
Quem pode ser hipnotizado?
Marcelo Behm: se a hipnose é um estado natural de todo ser humano, então todos podem ser hipnotizados. Porém não é recomendado você aplicar a técnica em esquizofrênicos, epiléticos, ou pessoas sob efeito de entorpecentes.
Margareth Borniatti: a hipnose não tem restrição porque ninguém perde a consciência. Só é um estado de concentração com hiperfoco na atenção e percepção. Pode até acontecer alguma paralisação no corpo, mas jamais na consciência.
Ainda existem muitos mitos sobre a hipnose, como por exemplo, a pessoa ficaria sob controle do hipnólogo. Como explicar que isso não é verdade?
Marcelo Behm: o indivíduo não faz nada que vá contra os seus valores éticos e morais. Por exemplo, se você está hipnotizado e eu der um comando para você assaltar um banco, você saberá que isso é errado. Resumindo, a pessoa não vai fazer nada que ela não faria em um estado normal.
Jussara Munareto: é importante ressaltar que toda a hipnose é uma auto-hipnose. A pessoa não sai do corpo, ela está totalmente presente e com o foco apenas nela mesma, nas suas emoções. A hipnoterapia é diferente da hipnose de palco. Essa não tem objetivo prático e benéfico para a pessoa que está passando pelo processo, apenas demonstra a existência de um estado hipnótico na pessoa humana.
Margareth Borniatti: a abordagem ericksoniana (criada por Milton Erickson) utiliza anedotas e metáforas que nunca vão direto ao ponto. São sugestões que estão escondidas numa conversa casual, jogando no terreno do talvez. Compreende o lado direito do cérebro, responsável por governar as emoções e parte do inconsciente. E é aí que vamos trabalhar e fazer mudanças. É auto reflexiva e educadora.
Quem foi hipnotizado, para curar medos, ansiedades ou outros tipos de doenças, deve continuar tratamento depois?
Marcelo Behm: a hipnoterapia é uma terapia breve. Nossa ideia não é criar vínculo com o paciente. Obviamente, existem casos em que é necessário todo um processo para ressignificar o trauma e aprender um novo comportamento. Isso demora um pouco mais tempo. Mas em casos de ansiedades, fobias, limitações, síndromes de pânico, disfunções sexuais, três sessões conseguem resolver o problema.
O funcionário público Moisés Metz, a empreendedora e consultora Iva Cardinal, e a terapeuta Gislaine Lechinski já vivenciaram a prática e compartilham aqui o resultado de suas experiências como pacientes em terapias de hipnose.
Moisés Metz: eu sempre sofri com ansiedade e depressão. A terapia convencional já não resolvia meu problema. Foi então que eu decidi tentar a hipnose. Fui totalmente desacreditado e sem esperança que pudesse funcionar. Estava enganado! Em uma sessão, saí de lá diferente e ao longo dos dias aquela ansiedade que me incomodava já não existia mais. Achei tranquilo ser hipnotizado. As pessoas têm muita expectativa de que você vai viajar para outro planeta e que vai perder o controle da mente. Na verdade é só uma conversa em que a gente está super focado e prestando atenção a tudo o que o terapeuta fala.
Iva Cardinal: a minha experiência não foi a mais positiva. Cheguei tensa e esperando resultados imediatos. Esperava que a minha vida mudasse ou que efeitos muito significativos acontecessem em determinado número de sessões. Acabei frustrada. Quando tentei um segundo profissional, adepto da abordagem ericksoniana, tirei o peso da expectativa e consegui resultados mais expressivos.
Gislaine Paiva Lechinski: comecei um curso de hipnose sem saber nada do assunto. Até que me perguntaram se eu tinha alguma pendência para resolver. Eu tinha. Ali, comecei a mexer em coisas e situações que eu nem lembrava mais. Eram emoções que estavam atrapalhando meu desenvolvimento pessoal. Desse momento em diante, não parei mais de estudar sobre o assunto.
Marli Borniatti
2 de junho de 2021 @ 17:57
Bem didática a matéria. Interessante.